Durante quase toda a década de 80 minha família e eu morávamos em um bairro chamado Vila Bela na Zona Leste de São Paulo e na esquina de casa havia um bar/padaria que atendia a todas as necessidades mais urgentes do nosso dia a dia. Minha única atribuição, além da escola, era ir até esse lugar para comprar pães e leite tipo C.
Em uma dessas minhas idas quase diárias para o bar do Sr. João avistei na rua de paralelepípedos algo que parecia ser um cartucho de Atari 2600 todo detonado no meio da rua. Certamente esse cartucho estava na rua já fazia algumas horas e por muita sorte ou talvez obra do destino ainda não tinha sido atropelado.
Não pensei duas vezes e corri para pega-lo.
Por pouco não fui atropelado por uma moto que vinha descendo a rua e jamais imaginou que aquela criança na calçada se atiraria em direção ao meio da rua tão repentinamente. Enfim, consegui salvar o cartucho e eu mesmo de um atropelamento.
Quando peguei o cartucho em minhas mãos bateu uma certa frustração. Certamente aquele pequeno pedaço de plástico já tinha visto dias melhores. Era um cartucho todo preto, o Label havia sido removido, muito porcamente por sinal e estava cheio de cola. A carcaça estava toda arranhada e até mesmo quebrada em algumas partes.
Mas respirei um pouco mais aliviado quando vi que o chip estava íntegro. Pelo menos a parte que eu conseguia enxergar.
Passei o caminho todo imaginando que jogo seria aquele e como aquele cartucho tinha ido parar lá abandonado no meio da rua. Será que aquele era um jogo que eu já tinha ou seria alguma novidade? Pela condição do cartucho eu achava pouco provável que ele, naquele estado funcionaria. Mas não perdia as esperanças, afinal eu não tinha nada a perder.
Chegando em casa deixei os pães e o leite sobre a mesa e corri para o meu quarto testar o novo jogo. Confesso que ali parado em frente ao meu querido Atari 2600 e a TV no meu quarto fiquei com um certo receio de colocar aquele cartucho naquelas condições e danificar meu console.
Mas a insegurança acabou sendo vencida pela curiosidade. Inseri o cartucho no console, cruzei os dedos, liguei e para minha surpresa o cartucho estava funcionando. Me senti a criança mais sortuda do mundo.
O mais legal de tudo é que aquele era um jogo totalmente novo para mim, eu nunca tinha sequer visto em lugar nenhum.
O jogo todo se passava em um único cenário com um fundo todo preto, colunas em ambos os lados da fase sustentando um imenso telhado. Os inimigos se moviam de um lado para o outro da tela e nosso personagem estava localizado na parte inferior e disparava alguns projéteis. Comecei a jogar e logo percebi que era inútil atirar nos inimigos diretamente. O objetivo aqui era acertar o telhado e fazer com que um pedaço desse mesmo telhado acerte os inimigos.
O jogo era muito divertido e depois de jogar por alguns minutos eu já estava encantando com o novo jogo. Mas algo me incomodava. Eu não sabia qual jogo era aquele. Eu sabia o nome de todos os meus jogos, mas não tinha nenhuma pista de qual o nome da minha mais nova aquisição. Na minha cabeça era inadmissível deixar um jogo da minha coleção sem um nome ou mesmo um apelido que fosse.
Depois de pensar um pouco e certamente influenciado pela série Tokusatsu que eu assistia diariamente na TV resolvi que aquele seria jogo do: “Fantástico Jaspion”. Afinal de contas o protagonista poderia ser qualquer personagem que eu quisesse.
Recentemente descobri que o nome verdadeiro do jogo é No Escape e se passa na Grécia. Tem bastante coisa de mitologia, inclusive os monstros que derrotamos como os centauros. Mas na época eu não fazia ideia.
Sinceramente não sei que fim levou aquele cartucho, mas certamente ficou comigo enquanto eu tive meu Atari 2600. Lembro com carinho dessa história porque No Escape acabou se tornando um dos meus jogos preferidos do Atari e eu sempre volto para revisitar essa perola pouco conhecida da biblioteca do Atari. Quem sabe se esse cartucho ainda não está funcionando hoje na casa de alguém por aí.