Antes de existirem pixels, continuações ou consoles, havia mito e sangue, aço e encantamento. O gênero Espada & Feitiçaria — que incendiou as páginas das revistas pulp nos anos 1930 — é o berço de tudo que inspirou Golden Axe. Em um mundo sem heróis impecáveis, mas repleto de guerreiros brutais, feiticeiros depravados e civilizações em ruína, nascia uma forma de contar histórias que unia o misticismo ancestral à violência bárbara.

Segundo o livro O Guia Definitivo da Espada & Feitiçaria, de Alexandre Callari e Bruno Zago, o gênero se define por heróis que “lutam não por ideais ou bandeiras, mas pela própria sobrevivência, glória ou vingança”. Não há reinos nobres ou dragões a serem domados em nome do bem. Há apenas o caos da existência, o poder do instinto e a vontade de desafiar os deuses com as próprias mãos.

Diferente da fantasia épica, que exalta a coletividade e o heroísmo moral, a Espada & Feitiçaria mergulha no indivíduo — um protagonista condenado a vagar entre o sagrado e o profano, onde a magia é tão perigosa quanto útil, e a civilização é apenas um verniz fino sobre a selvageria humana.
Callari e Zago apontam que seus heróis são “homens e mulheres forjados pela dor, pelo aço e pelo destino”, seres que vivem entre o fogo da batalha e o silêncio dos deuses esquecidos.

Entre esses heróis, o nome Conan, o Bárbaro ecoa como um trovão. Criado por Robert E. Howard, Conan é o arquétipo máximo do gênero — um guerreiro cimeriano que, em meio a bruxos, monstros e impérios decadentes, sobrevive com o que tem de mais puro: a lâmina e a coragem. A partir dele vieram outros ícones, como Fafhrd e o Rato Cinzento, de Fritz Leiber, e Elric de Melniboné, o albino amaldiçoado de Michael Moorcock, cuja espada Stormbringer devora almas com a mesma fome de poder que seus portadores.

1. Robert E. Howard

Escritor norte-americano (1906-1936), considerado o pioneiro do gênero sword & sorcery, criador do icônico personagem Conan, o Bárbaro. A história dele mistura aventura, fantasia primitiva e brutalidade — elementos que influenciaram diretamente a ambientação de franquias como a que estamos abordando.

2. Fritz Leiber

Escritor americano nascido em 1910 e falecido em 1992. Reconhecido por suas histórias de aventura fantástica, horror moderno e ciência-ficção. Leiber ajudou a definir o molde da fantasia sombria e aventureira, onde heróis errantes enfrentam magistrados místicos — um complemento direto ao ambiente de “ferro e feitiçaria” que queremos retratar.

3. Michael Moorcock

Escritor britânico nascido em 1939, figura central da fantasia moderna. Ele expandiu os conceitos do herói mítico, do conflito entre ordem e caos e da magia como força ambígua. A influência dele ecoa em videogames que misturam violência épica e elementos místicos — assim como a franquia que estamos explorando.

Essas histórias transbordavam vitalidade crua. Eram cheias de selvas amaldiçoadas, templos esquecidos, deuses indiferentes e criaturas grotescas, todas orbitando em torno do homem primitivo e sua luta contra forças que jamais compreenderia por completo.
Era uma fantasia que soava suada, brutal e intensa — muito mais próxima de um ringue sangrento do que de um conto de fadas.

“A Espada E Feitiçaria é o palco onde o bárbaro encara o abismo, e o abismo encara de volta.”n— Alexandre Callari, O Guia Definitivo da Espada E Feitiçaria

E foi justamente desse abismo que nasceu Golden Axe. No fim da década de 1980, enquanto os arcades ferviam com ninjas, robôs e guerreiros espaciais, a SEGA decidiu revisitar aquele imaginário de ferro e fogo. O designer Makoto Uchida, fã confesso de Conan, o Bárbaro (1982) e do universo de Howard, queria criar um jogo que evocasse a selvageria e o misticismo da Espada & Feitiçaria, mas com o toque eletrônico dos 16 bits.

Assim, em 1989, os fliperamas receberam uma nova forma de brutalidade pixelada: Golden Axe. Um jogo onde magia e aço se fundem, onde guerreiros e amazonas enfrentam esqueletos, ogros e dragões em um mundo devastado chamado Yuria.
A essência pulp renascia — só que agora, em sprites coloridos, trilhas poderosas e magias devastadoras que transformavam a tela em puro caos.

Como Conan, Tyris Flare e Ax Battler não lutavam por glória divina, mas por vingança, liberdade e sobrevivência.Cada fase era uma odisseia sangrenta em direção ao castelo do tirano Death Adder, o feiticeiro que empunhava o lendário machado dourado — símbolo de poder absoluto e corrupção.

Com isso, Golden Axe tornou-se mais que um jogo: virou a tradução digital da Espada & Feitiçaria, uma ponte entre o mito antigo e o joystick moderno.
Um lembrete de que, mesmo na era dos pixels, o chamado do aço ainda ecoa nas montanhas de Yuria.